A captura de um instante

Imagine um par de olhos grandes, de um cacau viçoso, refletindo a luz quente e vibrante entrando pela janela, na qual ela se recosta prazerosamente para registrar o momento de orgulho pelo trabalho recém-concluído. Internamente, os raios espelham o exato instante em que percebe ter alcançado o resultado que queria. As unhas que acabara de fazer ficaram do seu agrado. Nos lábios, um sorriso largo revelando a satisfação já pronunciada nos pulinhos que agora são refreados pelo adulto que controla a sua criança.

Cuidadosamente, ela posiciona a mão direita em frente ao rosto para cobrir os lábios e mostrar as unhas de um vermelho intenso que estão propositalmente viradas para a câmera. A camisa branca com a parte frontal coberta por pregas, faz o contraste perfeito contra o encarnado, emoldurando um trabalho bem feito da principiante, que se delicia nas cosquinhas de contentamento. Com a mão esquerda, segura o celular aonde a selfie registra o resultado que será compartilhado com duas ou três das pessoas que mais confia. 

Enquanto a vida de muitos segue num ritmo acelerado, ninguém, exceto ela, sabe o que se passa no aconchego do seu quarto alugado na desconcertante cidade de Los Angeles, na Califórnia. Nem mesmo o marido ou as colegas de casa, que passam os dias como as demais pessoas dessa cidade ocupada e vibrante, tomarão conhecimento da existência de tal instante. Esse momento é só dessa moça de cabelos castanhos e sorriso privado e ela convidará apenas aqueles que forem muito próximos para saboreá-lo. A única testemunha é a voz de Xavier Rudd lhe sugerindo seguir o sol e qualquer lado que o vento sopre quando o dia acabar... Atrás dela, uma caixa contendo uma porção de esmaltes de cores variadas descansa sobre a escrivaninha à espera das próximas aventuras da criança que teima em permanecer.