É melhor ser alegre que ser triste...

Enquanto me aproximo da cozinha, deixo-me envolver pela doce e aveludada voz de Bebel Gilberto, em sua versão do Samba de Benção, tocada pelo aparelho de som do vizinho da casa de baixo.

                         "É melhor ser alegre que ser triste  

                          Alegria é a melhor coisa que existe 

                         É assim como a luz  

                         No coração..."

A letra embala os meus pensamentos e me preenche com a mensagem de que tenho escolha. Que escolher ser alegre é melhor do que escolher ser triste. Sem postergar mais um minuto, me entrego a doçura do momento, repetindo suas palavras e sentindo meu corpo mover-se suavemente, no que parece uma tentativa de dança.

                         “Mas pra fazer um samba com beleza 

                          É preciso um bocado de tristeza,  

                         é preciso um bocado de tristeza 

                         Senão não se faz um samba não” 

Estes movimentos graciosos me levam de um lugar para o outro na cozinha enquanto minhas mãos vão recolhendo, um a um, os ingredientes que preciso – seis copos de caldo de legumes, três colheres de azeite de oliva, quinhentas gramas de cogumelos, um copo de arroz arbóreo, meia taça de vinho seco branco, sal, pimenta preta, três colheres de cebolinha picada e quatro de manteiga sem sal. Finalizo com um copo de parmesão ralado.

Com a mão esquerda, seguro a cebola contra a tábua e corto em pequenos cubos. Repito o mesmo processo com os cogumelos, um a um. Com a mão direita, pego uma panela de tamanho médio, adiciono o azeite e a cebola picada, e levo ao fogo médio.

                         “Põe um pouco de amor numa cadencia 

                         E vai ver que ninguém no mundo vence

                         A beleza que tem um samba não”

Percebo meus lábios murmurando a letra de Vinicius de Moraes, enquanto respiro a fragrância da cebola em cozimento. Em poucos minutos, sinto a boca salivando em antecipação ao saber da comida que estou preparando.

Quando os cogumelos ficam macios, adiciono o arroz, mexendo até que os grãos fiquem com uma cor de dourado pálido. “Hummm! Cheira tão bem!”, penso comigo mesma, sentindo os movimentos da música que agora toca apenas na minha lembrança.

"É melhor ser alegre que ser triste

                         Alegria é a melhor coisa que existe"

Estico o braço esquerdo, pego a taça de vinho, adiciono na panela e sinto a mistura liberar um bafo quente, que entra pelas narinas sem me dar a chance de escapar. Respiro o álcool que logo se dissipa como acontece com todos os pensamentos que vinha carregando na mente o dia inteiro.

Assim que o liquido é absorvido, adiciono o caldo de vegetais, uma concha de cada vez, mexendo frequentemente para ter a certeza que a mistura não vai grudar no fundo da panela. Experimento e o arroz está “al dente”. Perfeito! Desligo o fogo e removo a panela para a minha direita. É hora de adicionar os últimos ingredientes – manteiga, queijo ralado e cebolinha verde. Misturo tudo e experimento novamente. “Yummy!”

Vou até a pia para deixar a colher e quando me viro, meus olhos vão de encontro aos Dele, que está entrando na sala de jantar, recém chegando do trabalho. Dou alguns passos e nos encontramos na porta da cozinha. Nos beijamos e ele desaparece pela mesma porta que acabara de surgir. Enquanto vai até o quarto para deixar a mochila, eu preparo a mesa e sirvo dois pratos. Assim que ele retorna, nos sentamos a mesa para apreciar o delicioso risoto fresquinho e compartilhar sobre as aventuras do nosso dia.